Realizado em torno de uma equipe de futebol em Athis Mons, cidade na periferia sudeste de Paris, o webdocumentário Les Yeux Dans La Banlieue (De Olho na Periferia) faz um bom recorte sobre a situação dos jovens, filhos da imigração, que habitam as periferias da capital francesa. Longe dos estereótipos e das abordagens tradicionais, que exploram o lado violento e conflitante dessa geração, o filme faz um retrato humano, abdicando de comentários em 3º pessoa e deixando que a narrativa se desenvolva apenas pela voz dos jovens entrevistados.
Futebol, conflitos raciais, imigração e inserção social já encontrariam bases bastante fortes para repercutir o webdoc pelo país europeu. Ainda assim, a abrangência do projeto foi amplificada no momento da estreia pois, por coincidência ou não, o site foi ao ar no começo de julho, algumas semanas depois da eliminação da equipe francesa no mundial de futebol, fato que despertou uma grande polêmica e debate sobre o caráter multicultural e a origem não francesa dos jogadores da seleção.
Mas a seleção nacional, assim como o pequeno time de Athis Mons, são apenas microuniversos de uma realidade que atinge cada vez mais a França e outros países do continente europeu. A imigração cresce vertiginosamente e é necessário assimilar e integrar esse contingente humano. As histórias dos jovens de Athis Mons, suas experiências com a escola, política, amigos, parentes, seu cotidiano e suas expectativas para o futuro, retratados no webdocumentario, levam o espectador ao centro desse contexto social.
A energia do filme encontra espaço na força e sinceridade dos depoimentos dos nove meninos e meninas que participam do projeto. Longe do modelo tradicional de documentário, construindo o discurso a partir da voz intelectual do realizador, aqui quem faz o filme são os próprios jovens e, nesse caso, a não linearidade do webdocumentário assume um papel fundamental.
Isso porque o Les Yeux dans La Banlieue não é um filme único, mas uma série de vídeos que compõe um complexo mosaico. É possível, por exemplo, clicar em um botão e assistir apenas a depoimentos de um determinado jovem sobre temas específicos, no mais clássico modelo documentário (entrevistado sentado de frente dando um depoimento para a câmera); ou então apostar em um modelo documentário completamente oposto, acompanhando o mesmo jovem nas ruas no seu dia a dia no estilo consagrado pelo cinema direto.
Se opções estéticas e formais sempre foram escolhas fundamentais para o realizador no campo do documentário. Os webdocs mostram que é possível conciliar modelos e expandir possibilidades, deixando a escolha a critério do espectador. Do futebol à vida nas periferias parisienses, quem ordena e interpreta a realidade é o espectador.
Les Yeux Dans La Banlieue
Produção: Zelios Interactive e Cente Nacional du Cinema et de l’Image Animée
Distribuição: Libération
Em francês